Os desafios e as descobertas na busca por embalagens alternativas ao plástico para alimentos agroecológico

Nos últimos meses o projeto Agroecologia sem Plásticos estudou alternativas para embalagens de produtos agroecológicos em São Paulo.

 

O olhar sistêmico exige refletir sobre os fluxos de diversos pontos de vista, sendo muito importante verificar fatores e critérios que precisam ser considerados para que a essência dos valores seja apresentada numa embalagem agroecológica:

 

• relação campo e cidade (considerando o deslocamento e diferenças climáticas e culturais);
• ciclos de comercialização dos produtos (curto na feira e nos grupos de economia solidaria e longo nas estantes de mercados);
• etapas para o consumo (produção, transporte, comércio, consumo, descarte/reuso);
• condições de embalagens artesanais e industriais (tempo, custo, técnica de produção e utilização);
• grau de elaboração do produto (de in natura a processado);
• possibilidades de compra, produção ou reuso de embalagens, entre outras.

 

Na metodologia de substituição consideramos as características e necessidades de conservação do produto a ser embalado, as condições de venda, armazenamento e tempo de prateleira, a necessidades de barreira que a embalagem deve prover: Proteção UV, barreira anti-umidade, antigordura, gasosa, etc. Assim, buscamos e experimentamos materiais e embalagens compostáveis ou retornáveis que se adequem às necessidades do produto, fazendo a checagem de viabilidade econômica, da aplicabilidade da solução com as agriculturas, produtoras e consumidoras. A maioria dos produtos in natura não precisam de embalagens ou já nasceram com uma embalagem natural, uma casca (ex: banana e mixirica), mas outros precisam de embalagens de proteção, como os ovos, tomates, morangos, grãos, entre outros. Diferente dos alimentos elaborados, como geleias, bolos, pães, queijos, entre outros, que costumam precisar de uma embalagem que também apresente o produto de forma atraente, como fruto de uma produção artesanal apetitosa, saudável, higienizada, feita de acordo com critérios atribuídos.

 

 

É possível também categorizar os produtos e suas embalagens por dificuldade de substituição do plástico, a partir da complexidade de necessidade de proteção do produto:

 

Da esquerda pra direita em ordem de complexidade de mecanismo de proteção da embalagem

 

 

Entre as soluções possíveis identificamos alguns cenários de necessidades e possibilidades:

• Embalagem bonita e resistente (ex: cesta de fibras naturais) são caras e/ou trabalhosas, mas são um produto em si e podem ser guardadas, reutilizadas, sendo a embalagem um produto em si e um motivo para comprar o produto. Essas embalagens dificilmente servem para logística reversa, porque as pessoas desejam mantê-las e não retornam.

• Embalagem frágil e temporária (ex: saco de papel) não costumam ser caras e podem servir apenas para transporte pra casa, exigindo que o produto seja reorganizado em outro recipiente pelo/a consumidor/a. Esse tipo de embalagem deve ser compostável.

• Embalagem resistente e comum/feia (ex: vidro) tem custo baixo, porque pode ser reutilizada, sendo implementada em um sistema de logística reversa.

 

 

Cestaria – Exemplo de embalagem bonita, de custo alto, com potencial baixo de retornar

 

 

Vidro – Exemplo de embalagem comum com potencial retornável

 

 

Saco de papel – Exemplo de embalagem frágil, inviável para logística reversa, mas compostável

 

 

As embalagens podem ter diversas origens, podem ser compradas (ex: papel, vidro, celofane), reutilizada (ex: cesta, vidro, sacola retornável),  manufaturada (ex: palha de milho, folha de bananeira, fita de fibra natural) ou combinada entre as possibilidades anteriores (ex: vidro e papel,
caixa e celofane, etc.). No desenho a seguir, as origens das embalagens estão relacionadas ao esforço, tempo e custo de produção. Sendo que a embalagem comprada tem baixo esforço, exige um tempo médio (para ir à cidade) e tem um valor monetário considerável. A embalagem
reutilizada, por sua vez, não tem custo monetário algum, exige um tempo de higienização e organização da logística reversa e precisa de um certo esforço. A embalagem manufaturada, feita pela própria agricultora ou alguém próxima exige um esforço e técnica correta para trabalhar em um
tempo justo e não precisar demorar muito, e baixo custo financeiro. Já as embalagens combinadas têm diversas possibilidades. O esforço é relativo às habilidades e técnicas, o tempo é relativo ao lugar de produção (no caso da compra), o custo monetário envolve tempo e esforço, o material comprado costuma ser industrializado.

 

 

Na pesquisa sobre biopolímeros e plásticos biodegradáveis descobrimos que muitas empresas produzem plásticos verdes, que são feitos de polímeros de origem fóssil, por ser mais barato do que o biopolímero com fibras naturais apenas na carga, no material que serve de base. Existem plásticos
como o PET de cana de açúcar, que embora venha de fontes renováveis, não é considerado compostável e pode demorar tanto tempo quanto os de origem fóssil para se decompor.

 

 

Na pesquisa de logística reversa entendemos a importância de conversar com todas as pessoas envolvidas, receber retornos principalmente das agricultoras e experimentar coletivamente alternativas. Estamos em contato com a RAMA (Rede Agroecológica de Mulheres Agricultoras) analisando as possibilidades de aperfeiçoamento do sistema de logística reversa.

 

Logística reversa: embalagens retornáveis separadas no Espaço Cultural Monte Kemel para serem transportadas para o Vale do Ribeira e distribuidas entre os bairros dos grupos de agricultoras

 

 

Dia 2 de setembro, em um sábado de manhã, foi feita uma oficina de confecção de embalagens junto com o coletivo Perifa Alimenta na Brasilândia. O Espaço Cultural Jardim Damasceno, a sede do coletivo, é um importante ponte de articulação comunitária na Brasilândia. É um polo experimental
de muitas práticas socioambientais, como a captação de água de chuva, uma horta medicinal, um biodigestor, a coleta de resíduos orgânicos do bairro, uma composteira, e a produção de alimentos agroecológicos. Junto com as mulheres do coletivo Perifa Alimenta, desenvolvemos opções de
costura de papel para embalagem e formas de embalar com folhas de bananeira e de açafrão. Entre os desafios que vivenciamos está a interrupção do processo com o grupo Perifa Alimenta devido à ameaça de reintegração de posse do centro comunitário pela prefeitura de São Paulo.

 

 

Na próxima fase do projeto, focaremos na produção do material gráfico e na tentativa de implementar algumas alternativas identificadas com os grupos parceiros. Porém, as dificuldades de comunicação com grupos de agricultoras no campo e grupos de consumo sobrecarregados torna o
caminho bastante lento. Identificamos que, no momento, o mais interessante é sistematizar visualmente e pedagogicamente as descobertas para compartilhar com a rede de agroecologia e ambientalistas na área dos resíduos sólidos. Os testes de implementação de embalagens no circuito
de produção, comercialização e transporte dos produtos é um trabalho de pesquisa que envolve muita gente, comunicação continua e disposição de colaboração de todas as pessoas envolvidas. Desafiador também é lidar com soluções muito tecnológicas, que exigem maquinário complexo e/ou
produtos importados além de uma monocultura da fibra utilizada (ex: celofane), porque são opções que divergem da busca por autonomia de soluções locais seguindo a lógica de produção agroecológica.

 

 

O principal desafio pode ser considerado a reflexão sobre os critérios de seleção dentro de um sistema capitalista ofertando falsas soluções lineares, enquanto buscamos soluções efetivas e sistêmicas considerando os ciclos naturais e uma vida digna e trabalho justo a todas pessoas envolvidas. Outro aspecto desse desafio da estrutura econômica vigente é o resgate de práticas tradicionais, perdidas no aceleramento da industrialização e urbanização da vida, pois o tempo hábil para elaboração de embalagens tradicionais é escasso e aumenta o custo do produto e a técnica necessária não está mais sendo repassada de geração em geração, nem em instituições de ensino. Desejamos apontar essa falta para instituições que poderiam investir em suprir nessa demanda, como os SESC e SENAR.

 

 

Fotos da oficina no Espaço Cultural do Jardim Damasceno com o coletivo Perifa Alimenta:

 

 




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